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Viva Maria! O cinema na construção da identidade e pela garantia de direitos

Há muitos caminhos possíveis para influenciar na superação de violências e na garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes, principais objetivos do projeto Estação Subúrbio – nos trilhos dos direitos (Avante e KNH). Debater e refletir sobre identidade é um deles e, dessa vez, esse foi o eixo escolhido para o primeiro encontro presencial desde o início da pandemia do Covid-19, na Ocupação Quilombo do Paraíso, no dia 12 de agosto, com a garantia de todos os cuidados necessários para a prevenção ao contágio e disseminação da doença, de acordo com os protocolos de saúde definidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Na roda de debates, o tema trouxe o questionamento: Quem sou eu?

Para que as crianças tenham seus direitos garantidos, o Projeto usa a estratégia de fortalecer as famílias e a comunidade. Desta forma, os adultos podem aprender e ensinar novas práticas e, também, movimentar as suas realidades em vista dos seus direitos. Nesse sentido, mantendo as medidas de prevenção ao Covid-19, foi em espaço aberto, com distanciamento físico e uso dos EPIs recomendados, que 11 mães assistiram ao curta Vida Maria (2006) e puderam refletir sobre suas vivências, assim como as experiências dos seus filhos (as). “Nosso objetivo era que elas se vissem enquanto pessoas e que isso as fizessem enxergar a construção do seu ‘eu’ dentro da família”, disse Eva Tomaz, assistente social do Projeto.
A premiada animação, que conta a história da menina Maria José conectada a duas gerações de mulheres da mesma família (sua mãe e sua filha), foi bastante eficiente em proporcionar importantes reflexões. “Elas fizeram um desenho que representasse o filme em diálogo às suas vidas para responder à pergunta: quem é você ao assistir esse filme? E surgiram, nas histórias devidas, questões como: exploração, direito à educação, e o que elas entendem que não devem repetir na sua família”, contou Eva.

Narrativa da realidade

A narrativa que contempla a vida das mulheres nordestinas, a partir da família da protagonista, ainda é muito presente no Brasil – inclusive na realidade e memória da Ocupação. Nesse filme, o relato de um acontecimento cíclico na família da personagem Maria mostra, didaticamente, a importância de compreender o brincar e o estudar como direitos, e esse foi o ponto de partida para que um debate rico se desenvolvesse após a sessão. “Temos direito ao estudo, o direito de brincar, o direito de correr. Só que temos que pontuar que ali não mostra só isso, ali tá mostrando a educação que ela não teve, que a mãe não passou para ela e ela não passou para a filha”, expressou Ana Maria, mãe de uma criança assistida pelo Estação Subúrbio.

O curta fez passar um outro filme na cabeça dessas mães, com todas as lembranças dessas mulheres que buscam outra realidade para seus (as) filhos (as), o que as fizeram relatar não só suas histórias de vida, mas os aprendizados que o Projeto construiu junto à comunidade. “Tirar água, eu já tirei na fonte, o que mais carreguei foi água na cabeça, sempre ajudei minha mãe em tudo, mas ia para o colégio. A Educação está em primeiro lugar!”, contou a senhora Gildete Lima, moradora da Ocupação Quilombo do Paraíso.
Levadas às memórias de suas infâncias, elas puderam refazer suas trajetórias até o momento presente – exercício que as fez falar sobre as expectativas para seus filhos (as). “Falo para minha filha que não quero ela com a ‘barriga no fogão’ de ninguém. É um trabalho digno, mas é algo que não quero porque sei que é humilhante. Digo a meus filhos que eles precisam estudar para ter algo na vida”, complementou Ana Maria, que também compartilhou seu sentimento sobre os desafios da vida no Brasil. “A pior coisa é viver em um País preconceituoso, não só em relação a cor, mas a classe social e gênero. Maria praticamente viveu a mesma coisa de sua mãe, mesmo em uma época diferente. Eu não quero que meus filhos passem o que eu passei, as humilhações”, expressou.

Na película, a mãe de Maria José é uma mulher que, por não ter tido acesso à Educação, não conseguiu romper o ciclo da pobreza. Justamente o que as mães da Ocupação pretendem fazer ao apoiar seus (as) filhos (as) a frequentar a escola e ter um futuro mais promissor, digno e com seus direitos garantidos. “Tirar o direito à Educação, à infância? Me senti revoltada, porque meu filho tem que brincar, tem que estudar, ele tem o direito dele e eu não posso proibir. Não vou tirar o direito do meu filho. Por mais que eu seja fraca, pobre, vou lutar”, trouxe Vera Lúcia, também umas das mães presentes ao encontro.

Para Eva, fazer essa atividade, estimulando a reflexão sobre quem elas são, como se veem e se identificam, fortalece não só as relações afetivas, mais também o vínculo comunitário. ”Buscamos estimular o reconhecimento de si enquanto cidadãs e, em paralelo, permitir o fortalecimento do espaço de convívio familiar e comunitário, sobretudo o desenvolvimento das relações afetivas,  para que sociabilidade da comunidade seja assegurada”, completou.

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