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Boulder Journey School: Educação como política e parceria escola/Universidade na formação dos professores

A Boulder Journey School (BJS), no Colorado, Estados Unidos, realizou o Seminário de formação de professores:  Boulder Journey School – Teacher Educators Summit at Boulder, nos dias 5 e 6 de abril para um público restrito de 40 pessoas, e teve entre seus convidados Maria Thereza Marcilio, presidente da Avante – Educação e Mobilização Social. No evento, Maria Thereza viu de perto o resultado da parceria entre a academia e a prática cotidiana na Educação Infantil. “É uma escola maravilhosa que, ao longo dos anos, notou a dificuldade de se ter educadores infantis com o olhar cuidadoso e respeitoso, e com a formação necessária para promover o desenvolvimento pleno das crianças. Lá, como cá [Brasil], as instituições de ensino superior ainda estão muito distantes da prática cotidiana, da realidade do dia a dia das crianças pequenas. Há muita produção teórica, mas a troca com a prática ainda não se faz de forma satisfatória. Então, o que a fundadora e diretora executiva da escola, até esse ano, Ellen Hall, fez? Se aproximou da Universidade do Colorado”, conta Maria Thereza.

Foram dois dias de discussão e trabalhos de grupos com reflexões, ao final de cada dia, coordenadas e provocadas por nada menos que Carlina Rinaldi, Presidente da Fundação Reggio Children em Reggio Emilia, na Italia. “Hoje, Carlina é a pessoa mais graduada de Reggio. Ela foi parceria de Loris Malaguzzi e a pessoa que coordenou esses dois dias de estudo”, disse Maria Thereza.

Antes de cada grupo de estudo uma mesa inspiradora, a primeira: Reinventando a formação de professores: inspirações e provocações do Boulder Journey School Teacher Education Program – Uma parceria com a Universidade do Colorado; a segunda: uma apresentação do trabalho do aluno do Programa de Educação de Professores da BJS. Na sequencia, os grupos de estudos se reuniram para refletir sobre: uma imagem forte do professor como aluno; o papel da tecnologia na formação de professores; e a parceria entre programas de educação de professores e escolas, e ouviram, ao final, as reflexões de Carlina Rinaldi.

Boulder Journey School

A BJS  é um centro de Educação Infantil privado, fundando há 30 anos por Ellen Hall, que foi sua diretora até este ano (2018). Ellen faleceu no dia 7 de março deste ano, após organizar todo o Seminário, que se tornou um evento em sua homenagem.

Elle Hall deu início à experiência que viria dar origem à Boulder Journey School com um atendimento a crianças pequenas no contra turno da escola. Iniciativa que ela intitulou Make a mess and make believe (Faça uma bagunça e faça de conta). “Ela começou com nove crianças e, por ser Ellen, por ter as referências que tinha, conhecedora de Reggio Emília, uma estudiosa, doutora em Educação, não apenas grande conhecedora da primeira infância como também uma militante incansável pelos direitos das crianças, a experiência cresceu de tal forma que se tornou a Boulder Journey School, essa coisa fantástica, uma escola muito próxima, do ponto de vista de referência, da proposta de Reggio Emília, com uma participação ativa de Carla Rinaldi”, conta Maria Thereza.

Para bons frutos, uma semente em terreno fértil e uma agricultora habilidosa. Foi assim com a BJS, cujo nome da escola leva o nome da cidade onde foi fundada, no Colorado (EUA), terra de David Hawkins, filósofo interessado nas ciências naturais voltadas para a primeira infância. “Ele foi um precursor da Educação a partir da realidade concreta, do uso da natureza e seus elementos desconstruídos, como os brinquedos que você possa inventar e não prontos, formatados, industrializados. A esposa de Hawkins, Frances Hawkins, foi professora de Educação Infantil a vida inteira e ambos são grandes referências”, conta Maria Thereza.

Foi nesse cenário que nasceu a aproximação de Ellen Hall com a Universidade do Colorado, que tem uma tradição de experimentação na área de Educação, com a qual Ellen estabeleceu um convênio. “Os alunos do curso de formação de professores da Universidade estagiariam na BJS e esta construiria o programa de formação junto com a Universidade. Essa é uma experiência única, eu diria que é, com certeza, uma experiência singular, um centro de Educação Infantil ser parceiro na elaboração da proposta do curso de formação de professores e este mesmo centro ser um lugar de observação onde os estagiários têm uma função muito mais ativa do que ser um estagiário, eles são professores, observadores, eles acompanham o dia a dia das turmas, assumem atividades durante todo o ano. Eles participam do cotidiano da instituição o tempo todo. E, por conta dessa relação tão próxima de Ellen com Reggio Emília, os alunos do curso fazem um estágio em Reggio, de 2 a 3 semanas todos os anos”, descreve, encantada, Maria Thereza.

Eventos como o Boulder Journey School – Teacher Educators Summit at Boulder são promovidos com frequência na Escola com o intuito de disseminar a proposta. “Este foi um evento pequeno, para convidados, a maior parte vinculada a universidades de formação de professor, seja da Califórnia, de Boulder, ou de outros lugares, tinha Tennessee, Virginia e tinha também gente ligada à Educação Infantil: professores, gestores de centros de Educação Infantil públicos e privados“, disse a presidente da Avante.

Ação Política

Em suas andanças por Boulder Journey School Maria Thereza pode perceber a forte influência de Reggio Emília na Escola, a rede pública de Educação Italiana que tomou a decisão, 70 anos atrás, de priorizar a Educação Infantil e de lá pra cá manteve intocável o orçamento voltado para esse segmento da Educação, “a não ser para aumentar”, frisa Maria Thereza. As diretrizes educacionais mantiveram-se as mesmas ao longo dos anos, mesmo com a mudança de prefeito: espaços de qualidade, formação de professor, participação infantil e transformação da cidade em um espaço educador. Um projeto que tem como diretriz mestra a ideia de que Educação é Política.

Para a presidente da Avante, o que faz a proposta de Reggio e da BJS se manterem coerentes com esse discurso é o fato da Educação arguir todos os outros setores da sociedade, a partir da proposta de participação das crianças na cidade. “Nos dois dias do Seminário houve apresentações fantásticas da BJS: uma sobre o cotidiano da escola, com a questão dos estudantes de pedagogia; e no outro dia uma apresentação sobre a relação escola/comunidade e participação ativa das crianças na vida da comunidade. São crianças cidadãs e isso é muito espírito de Ellen que, inclusive, integrou a equipe mentora e produtora do Voices of Children e garantiu a participação das crianças da Boulder no documentário”, disse Maria Thereza.

Ela conta que na BJS, como em Reggio, é possível experimentar a Educação como política. “Em Boulder as crianças são escutadas na própria escola e participam da cidade, vão para o City Council (Câmara Municipal) para demandar coisas e muitas elas já conseguiram resposta”. A BJS é uma escola privada que influencia outras escolas da região e seu entorno. Reggio é uma rede de Educação e pública. Não é possível colocar as duas experiências no mesmo patamar, mas em ambas a criança está no centro do projeto pedagógico, seja para a cidade ou para a instituição, gerando impactos locais ou mundiais.

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