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Aprendendo a escutar as crianças

Aprender a escutar crianças, como um dispositivo metodológico que pode dar mais sentido à prática pedagógica, é uma abordagem cada vez mais recorrente no contexto da Educação Infantil. Ao longo da formação continuada, proposta pelo programa Paralapracá, vêm sendo refinadas estratégias para promover o protagonismo infantil, por meio da escuta das crianças.  Hoje, as redes municipais de educação, parceiras do Programa, já contam com inúmeros relatos de educadores que vêm ressignificando práticas pedagógicas, revendo concepções e construindo ambientes privilegiados para a escuta.


“O Programa dialoga intimamente com as Diretrizes Curriculares Nacionais de Educação Infantil que define que a criança deve ser o centro do currículo. Nesse sentido, o Paralapracá reafirma esse princípio desde sua implantação. A todo instante a criança é colocada como protagonista desse processo, que por sua vez, deve ser ouvida e acolhida na sua inteireza. Ao mesmo tempo em que o Programa sugere que o educador faça essa escuta, ele também dá sustentação com excelentes materiais teóricos que são traduzidos de forma clara, dinâmica, numa linguagem prazerosa, sempre fazendo um elo da teoria com a prática”, relata Érika Patrícia, especialista em formação de professores de Educação Infantil, integrante da equipe técnica na Rede Municipal de Educação de Maceió (AL), parceira do Programa desde 2013.


Érika defende a escuta como um elemento que norteia as tomadas de decisões dos profissionais. “É através da escuta que vou saber do que as crianças gostam de brincar, o que fazem quando estão em grupos, sozinhas, o que conversam, que perguntas surgem, de que forma resolvem seus conflitos, que mecanismos utilizam para compreenderem a vida, que pensamentos evocam, que linguagem utilizam, como elaboram hipóteses. Conhecer a criança e eleger a escuta como um princípio da prática nos desloca para um lugar diferente do que estamos ‘acostumados’, nos obriga a pensar numa organização de trabalho onde a criança, de fato, é o foco. Acolher a escuta, pensar sobre o que vimos e ouvimos nos exige reflexão, sensibilidade e conhecimento para que possamos organizar o planejamento, a partir desses elementos. Todas as decisões devem ser tomadas a partir da escuta, a organização dos espaços, as brincadeiras e os projetos devem nascer dessa escuta atenta”, revela.


Formar para escutar  


Realizar uma observação atenta, aberta e sensível às atitudes das crianças, interpretando seus sentidos e incorporando esses saberes à prática é uma iniciativa que dialoga diretamente com processos formativos. Para Érika, essa é uma demanda formativa importantíssima e extremamente desafiadora, “justamente porque o planejamento vai sendo construído a partir dessa escuta de crianças, e o grande desafio é como traduzir essa escuta em ação pedagógica. Acolher o imprevisto, o inédito e as singularidades das crianças exige do professor mudança de postura, exige que ele seja o mediador dos processos educativos. Uma mudança que acredito que seja possível a partir da formação, de reflexão e de apoio de toda equipe pedagógica”, disse.


Especialistas têm, inclusive, alertado para a urgência de incorporar a aprendizagem deste tipo de atitude nos processos formativos. O tema pautou o recente artigo: Aprender a escutar crianças: um dispositivo de formação publicado na revista científica portuguesa Saber e Educar, escrito por Mônica Samia, consultora associada da Avante – Educação e Mobilização Social e coordenadora de projetos ligados à formação docente, entre eles o programa Paralapracá, e Maria Inez da Silva de Souza Carvalho, professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA).


“É imprescindível dialogar sobre a relevância de aprender a escutar crianças na constituição da profissionalidade docente, considerando os constructos que defendem a Educação Infantil como espaço de desenvolvimento e aprendizagem, onde a criança tem um papel protagonista e ativo. Para tanto, urge desenvolver esse tipo de atitude nos profissionais, para fundar uma ‘nova’ profissionalidade e fortalecer a escola como espaço de vida, carregado de sentido para as crianças, fortalecendo suas potencialidades e sua capacidade de aprender”, explica Mônica Samia, durante a I Jornada Internacional sobre a formação de professores/as de Educação Infantil, realizada pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL), em Maceió, entre os dias 25 e 27 de maio.


Autora, também, da tese de doutorado “Diálogos formativos: singularidades nas experiências de formadores da Educação Infantil” (2016), Samia conta que narrativas de campo sobre a constituição da profissionalidade de formadores que atuam na Educação Infantil revelam os efeitos de experiências de escuta de crianças nos formadores que participaram da pesquisa e apontam esta atitude como fundamental para a formação docente e dos formadores. “Em síntese, advoga-se que a escuta de crianças seja reconhecida como dispositivo de formação, não somente como uma estratégia metodológica nos processos formativos, mas como um elemento constituinte da profissionalidade docente, por ser esta uma condição de quem educa”, considera.


O Programa


O programa Paralapracá é uma frente de formação de profissionais da Educação Infantil, realizado pela Avante – Educação e Mobilização Social, com apoio do Instituto C&A. O trabalho se desenvolve a partir da formação continuada de formadores, com o objetivo de contribuir para a melhoria da qualidade do atendimento às crianças na Educação Infantil, com vistas ao seu desenvolvimento integral. Realizado em parceria com as secretarias municipais de Educação, o Programa valoriza, amplia e fortalece os saberes de cada localidade na qual é implementado.


O Paralapracá foi lançado em 2010, como um projeto do programa Educação Infantil do Instituto C&A, originalmente focado na região Nordeste. Desde então, chegou a dez municípios, em dois ciclos de implementação. Em 2015, com a chancela do Guia de Tecnologias Educacionais do MEC, ganhou caráter nacional.
 

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