A ideia surgiu das crianças: a turma do nível 4 do Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) Moema Tinoco, localizado em Natal, queria deixar uma lembrança na escola, no final do ano passado, antes de partir rumo ao ensino fundamental. Outras turmas tinham escolhido fazer festa, mas o grupo de 2014 queria construir um cantinho que permanecesse na escola – um lugar que todos soubessem que havia sido construído por eles.
A professora sugeriu transformar o pátio, que só tinha um pequeno tanque de areia e duas árvores, em uma praça de pneus. O material ficaria ali por pelo menos 400 anos e daria à turma tempo de sobra para as visitas sempre que batesse saudade. E foi assim, a partir desta sugestão de reorganização do espaço, que a escola presenciou a realização de um pequeno plano de mudança que acabou por transformar o jeito de as crianças brincarem no pátio.
“As crianças idealizaram e desenharam como queriam que fosse a praça”, relembra Maria Cristina da Silva Carvalho, coordenadora pedagógica da escola, contando que depois disso ela se juntou às professoras para conseguir os pneus que dariam vida ao novo espaço. “Fomos à comunidade e conseguimos um pneu de trator e outros menores”, relata. Quando o material chegou à escola, todos se envolveram na montagem da praça. As crianças escolheram a tinta, pintaram os pneus e a parede.
A praça estava quase pronta quando a turma do nível 2, envolvida com o projeto “Flores de todas as cores”, plantou, junto com suas mães e com as professoras, flores das mais diversas colorações no muro do pátio. “O cantinho da escola ficou um ambiente só: a praça de pneus e o jardim de todas as cores”, descreve Cristina.
O novo espaço foi inaugurado pelas turmas e serviu de cenário para todos os eventos importantes do fim do ano, como o amigo secreto. Durante as férias, algumas crianças do nível 4 foram espiar o legado deixado na escola. Hoje, o espaço é usado pelas professoras para contações de histórias e muitas outras ações. “As crianças marcam de fazer coisas lá e esperam os pais na praça. Ficou sendo o espaço delas”, diz a coordenadora.
A praça dos pneus com jardim florido do Moema Tinoco é um bom exemplo do que propõe a metodologia dos pequenos planos de mudança, uma das estratégias do eixo Organização do Ambiente do projeto Paralapracá. “Quando tivemos a formação em Olinda com os profissionais de Reggio Emilia, falamos muito em pequenos planos de mudança”, explica Mônica Samia, coordenadora-geral de implementação do projeto Paralapracá na Avante – Educação e Mobilização Social.
A especialista se refere ao V Encontro de Formação do Projeto Paralapracá , que foi realizado em agosto de 2014 e levou a Olinda duas pedagogistas de Reggio Emilia, cidade italiana reconhecida internacionalmente como referência na educação infantil. “É uma estratégia potente, que sai da ideia de que todos os espaços precisam ser transformados ao mesmo tempo e propõe ações mais pontuais, que acabam por reverberar em outras ações”, afirma a coordenadora.
Mônica destaca que um dos focos do eixo Organização do Ambiente é propor mudanças nos espaços para que eles promovam o protagonismo e a autonomia das crianças. “Falamos em organização de ambiente, que é mais amplo do que organização do espaço. Também tem a dimensão relacional, que se refere à qualidade das interações construídas entre crianças e adultos”, pontua. De acordo com Mônica, a estrutura física das instituições de educação infantil é um dos elementos mais desafiadores identificados pela consultoria Move na avaliação diagnóstica realizada nas escolas parceiras do projeto Paralapracá.
Na busca por enfrentar este desafio dentro das instituições de educação infantil, a coordenadora da Avante indica a convergência entre a metodologia dos pequenos planos de mudança proposta pelas pedagogistas de Reggio Emilia com a metodologia do Design for Change , projeto desenvolvido na Índia que pressupõe mudanças a partir do protagonismo dos diversos atores sociais, com ênfase nas crianças.
Em seu eixo Organização do Ambiente, o projeto Paralapracá utiliza essa metodologia para realizar mudanças nos espaços das instituições. De acordo com o Design for Change, os sujeitos precisam ser mobilizados a partir da ideia do “eu posso”, seguindo quatro verbos: sentir, imaginar, fazer e compartilhar. “Se você quiser realizar uma mudança, sinta qual a necessidade. Depois imagine uma solução, faça alguma coisa e compartilhe”, explica Mônica.
Se depender da mudança no Marina Tinoco, os quatro verbos foram seguidos à risca. A turma do nível 4 sentiu a necessidade de deixar uma marca na escola — e a professora sentiu a possibilidade de transformar o pátio externo. Todos imaginaram como mudar o espaço e fizeram o pátio sair do papel e ser de fato construído. O verbo “compartilhar”, por sua vez, está sendo bastante conjugado: na comunidade; entre coordenadores pedagógicos, nas formações do projeto Paralapracá; e para todos os interessados, aqui neste site.