Intersetorialidade como caminho, pelos direitos das crianças

Em um cenário de desmonte e destruição da Educação brasileira, agentes públicos e a sociedade civil organizada se unem para defender os direitos das crianças e adolescentes. Um dos temas debatidos por especialistas de diversas áreas é a intersetorialidade como solução para problemas relacionados à proteção de crianças e adolescentes, à qualidade da Educação, e à evasão escolar, entre outros. Em especial, após a pandemia, potencializar a solução de problemas históricos e que afetam milhares de cidadãos e famílias.   

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre 2019 e 2021 o Brasil teve queda de 7,3% nas matrículas na Educação Infantil, o que representa 653.499 crianças de até cinco anos fora da escola durante a pandemia. Até então, desde 2005, o país vinha registrando aumento de matrículas nessa etapa de ensino. Entre as crianças de 6 a 14 anos a evasão escolar teve um aumento de 171% no período mais crítico de isolamento social. Os dados estão no Censo Escolar 2021, feito pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), e divulgado no final de janeiro de 2022.

Isso amplia desafios históricos referentes à garantia de direitos das crianças e adolescentes, e torna o cenário ainda mais complexo, pois a escola é um lugar privilegiado para a superação de cada um deles. É na escola, por exemplo, onde mais se detecta abuso e violência contra a criança, em especial quando o infrator é um membro da família, ou mesmo problemas de saúde da criança. É o professor quem identifica e pode acionar o órgão de saúde, o órgão de assistência e a própria família. É também na escola que é garantido o direito à convivência e à socialização.

Reconhecer e resolver problemas

O trabalho intersetorial é capaz de diminuir a evasão escolar e outros problemas enfrentados pelas crianças. Com um olhar atento e voltado para as múltiplas dimensões de um indivíduo: física, intelectual, social, afetiva e simbólica, o trabalho intersetorial articula sujeitos de setores diversos, com diferentes saberes e poderes, para enfrentar problemas complexos. Fortalece e reúne conhecimentos, práticas e estruturas sociais e culturais para que Educação, Saúde, Assistência Social e Cultura dialoguem e somem esforços na execução conjunta de ações que beneficiem o cidadão.

Para Maria Thereza Marcilio, presidente da Avante – Educação e Mobilização Social, a pandemia potencializou a necessidade de agir intersetorialmente e nos deu a oportunidade de discutir isso mais aberta e amplamente, mas reconhece que para ter uma ação organizada e coordenada intersetorialmente é preciso uma ampla reunião de esforços e olhares. “Temos que dizer como as coisas podem acontecer, juntos, intersetorialmente, assumindo a força que temos e que talvez não esteja sendo utilizada”, disse Maria Thereza. 

A presidente da Avante vê o trabalho intersetorial extremamente facilitado pelas tecnologias de informação e comunicação, que possibilitam a descentralização das tarefas, coordenação em rede e a participação de grande número de atores, possibilitando a resolução de desafios complexos. “A integração dos setores auxilia também nas dificuldades enfrentadas pelos profissionais dessas políticas, articulando posturas, novos mecanismos e ações, e buscando a garantia dos direitos fundamentais de cada cidadão”, disse.

Os projetos Primeira Infância Cidadã (PIC) e INDIQUE Salvador, desenvolvidos pela Avante em parceria com a Petrobras e a Secretaria Municipal de Educação de Salvador, respectivamente, são exemplos de trabalho intersetorial que vem dando resultados positivos.

INDIQUE Salvador

O INDIQUE Salvador é um documento utilizado como referência para avaliar a qualidade do atendimento na Educação Infantil na Rede Municipal. Tomando como referência os Indicadores da Qualidade na Educação Infantil do MEC, o documento foi adaptado para a realidade local, foi revisado e atualizado, culminando em uma versão que contempla o trabalho intersetorial a partir de um diálogo entre as secretarias de Educação, Saúde e Assistência Social; e um olhar territorial, ao reconhecer a diversidade da Rede de Salvador. 

Após a autoavaliação, os dados coletados serão inseridos no Sistema de Monitoramento do programa Nossa Rede Educação Infantil, uma plataforma web construída na primeira etapa da parceria entre a Avante e a Secretaria de Educação de Salvador (2014 – 2018), também atualizado para esta nova fase do processo avaliativo.

Como enfatiza a consultora associada da Avante, Fabíola Bastos, coordenadora do INDIQUE Salvador, “esse encontro intersetorial fortalece o diálogo entre as instituições de Educação com outros órgãos/áreas/políticas de proteção à primeira infância. Esses diferentes olhares dos atores que compõem o Sistema de Garantia de Direitos (SGD) poderá contribuir de forma mais efetiva para a melhoria da qualidade da educação que é oferecida às crianças dos diferentes territórios”, afirmou.

PIC – Primeira Infância Cidadã

O Primeira Infância Cidadã (PIC) atua pelo fortalecimento do Sistema de Garantia de Direitos (SGD) e da rede de proteção da primeira infância por meio de formações de professores, agentes públicos, gestores da educação, dentre outros atores, favorecendo a articulação de setores do serviço público para atender às diversas necessidades da criança, como indica o Plano Nacional pela Primeira Infância (PNPI 20-30).

Em seu objetivo geral, o PIC traz embutida a ideia da intersetorialidade, pois trata da priorização da primeira infância na agenda municipal por meio da articulação e fortalecimento do SGD, das políticas públicas e da elaboração e revisão dos Planos Municipais pela Primeira Infância (PMPI). Como relata Ana Luiza Buratto, vice-presidente da Avante – Educação e Mobilização Social e coordenadora geral do PIC, os operadores do SGD são representantes de diversas áreas do município, portanto, o funcionamento do Sistema, de forma integral, pressupõe o trabalho intersetorial. “O ser humano, quando atendido por qualquer área ou setor, deve ser reconhecido em sua integralidade para que o atendimento seja eficaz. A vantagem da intersetorialidade é uma maior racionalidade no uso dos recursos e melhores resultados nos programas. Em função dela, nós verificamos como resultado a integralidade do cuidado individual e coletivo e a corresponsabilidade dos integrantes do atendimento, tanto os usuários quanto os agentes e gestores, com um maior compromisso de todos os atores”, afirmou.

Uma resposta

  1. A democratização instuticional tornou-se um novo caminho para promover a prática pedagógica para a contribuição do processo participativo mais amplo.

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