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Instituição vai para além dos muros e leva cultura infantil à comunidade

“Pega o papel picado molhado com cola e amassa”, ensina Vitória dos Santos, de 3 anos, a um dos muitos repórteres que fizeram a cobertura da exposição da Instituição Comunitária de Educação Infantil Brincando e Criando, que ocupou a praça do bairro Novo Horizonte, em Camaçari (Ba), no último dia 14 (novembro). Vitória, que estava ao lado de sua mãe em um dos stands do evento recebendo o público, explica o que aprendera na oficina de papel machê, realizada pela companhia de limpeza pública do município (LIMPEC) como uma das ações do projeto Criando e Brincando com a nossa Cultura, que deu origem à mostra na comunidade.

Na praça ficaram expostas as produções fruto das pesquisas realizadas por 85 crianças entre 3 a 5 anos sobre a história do seu bairro e brinquedos e brincadeiras da comunidade. A investigação foi feita juntamente com os educadores e alguns pais. A decisão inédita de extrapolar os muros da instituição aconteceu como resultado da formação continuada dos coordenadores pedagógicos realizada pelo projeto Paralapracá. Uma vez fortalecidos em seu papel de formador, esses educadores levam os eixos formativos, nesse caso: Assim se Brinca e Assim se Explora o Mundo, para dentro das escolas.

“O fortalecimento do nosso papel como formador tem sido de grande relevância para o movimento de valorização da infância na instituição e na comunidade também. Até então nós trabalhávamos com o conceito de fazer para a criança. Agora, fazemos junto com as crianças, a partir do que escutamos delas”, ressalta a coordenadora pedagógica da instituição Edna Matos.

Além da exposição, o evento também proporcionou momentos de brincar a aqueles que compareceram aos stands. “Os educadores e familiares organizaram diferentes ambientes para os convidados: pingue-pongue de mesa, cantinhos de leitura, de brinquedos e brincadeiras, garantindo a interação de todos”, conta Rita Margarete, assessora do projeto Paralapracá no município, que esteve presente no evento.

O projeto Paralapracá, é uma frente de trabalho do programa Educação Infantil do Instituto C&A que tem por objetivo contribuir para a melhoria da qualidade do atendimento às crianças na educação infantil, com vistas ao seu desenvolvimento integral. O projeto atua em duas linhas de ação que operam de forma complementar e estrutural: a formação continuada de profissionais da educação infantil e o acesso a materiais de qualidade, tanto para as crianças quanto para os profissionais.

Investigação

 Os produtos e conhecimentos construídos pelas crianças, e expostos durante a mostra do projeto, foram resultados de pesquisas junto à comunidade. “Elas vêm entrevistando moradores antigos e ilustres do bairro ao longo de um ano e fizeram descobertas sobre os encantos e desencantos da sua vizinhança, além de brinquedos e brincadeiras de antigamente”, conta Rita Margarete.

Com apoio das famílias e dos educadores, as crianças registraram suas descobertas por meio de relatos escritos, pinturas, modelagens e confecção de brinquedos e fantasias, utilizando materiais recicláveis: garrafa pet, lata e embalagem de leite, tampa de garrafa, papelão, rolo de papel higiênico e vasilhas de manteiga. Participaram também de uma oficina de papel machê oferecida pela LIMPEC.

Pedro Henrique Silva, de 6 anos, por exemplo, construiu um brinquedo chamado pé de lata, que fez com cordão, lata de leite e emborrachado, conforme explicou ao repórter da Secretaria Municipal de Educação de Camaçari. “Me diverti muito fazendo o brinquedo e gosto de brincar com ele na escola com meus amigos”.

“O grande barato da feira é que eles se conscientizaram que nós podemos reutilizar o lixo e que esses ‘restos’ podem deixar tudo bonito”, comenta Edna Matos.

 Visibilidade

As falas das crianças nesse texto (Pedro Henrique e Vitória – na abertura da matéria) foram registradas pela imprensa (site da Secretaria Municipal de Educação de Camaçari). Assim como as de muitas crianças que foram ouvidas pela televisão, jornais e rádios do município. “O evento teve larga cobertura da imprensa local. Essa visibilidade é coisa nova. Foi até engraçado porque os repórteres pediam que nós mostrássemos os brinquedos, pois eles não conheciam”, conta a coordenadora pedagógica da instituição. E quem deu toda a explicação foram as próprias crianças, que ficaram nos stands junto com suas mães. E para alegria da coordenadora, “as crianças surpreenderam”.

Edna Matos ressalta, no entanto, que ainda é cultural a criança passar despercebida tanto na comunidade como na própria família. Situação que começou a ser mudada a partir da mostra.  “O contato com a comunidade para a pesquisa do projeto e a culminância com a mostra colaboraram muito para que tanto a comunidade como a família começassem a ter uma maior percepção de que elas são seres que questionam, têm direitos e pensam”, diz.

Junto com os pais

A coordenadora pedagógica conta que mesmo após o evento ainda havia pais questionando a proposta de uma ação com tamanho envolvimento das crianças e das famílias. No entanto, “esse ano quase 60% das famílias já nos apoiaram. Ano passado era maior o número de pais que não acreditavam e até falavam em tirar os meninos da escola”, conta Edna Matos, que reforçou junto aos professores, durante reunião de avaliação do evento, a importância de eles terem segurança em relação ao que se estava construindo na instituição. “O apoio deles fortalece a proposta”, afirma.

“No início, nós professores estávamos sentindo falta dos pais presentes na instituição e a partir desse projeto eles passaram a acreditar mais, a se envolver”, relata Lusinete Evangelista França, educadora da instituição. Ela conta que um dos objetivos era justamente aproximar a família e a comunidade. “No dia da culminância ninguém sabia quem era pai ou funcionário da escola”.

Lusinete relata ainda que no momento em que os pais vieram para a instituição as crianças ficaram visivelmente mais felizes e durante o evento mostravam orgulhosas a presença deles nos stands. “Houve uma troca de aprendizagem importante entre pais e filhos”, diz a professora.

Educação Infantil transformada

Edna Matos conta que quando assumiu a instituição em 2010 verificou que havia uma descrença da comunidade em relação à proposta da Brincando e Criando. A coordenadora pedagógica conta que o bairro de Novo Horizonte possui um grande número de instituições particulares, para onde eram levadas a maioria das crianças da vizinhança. A Brincando e Criando acabava por atender apenas a população do bairro vizinho que possui uma população de baixa renda, em sua maioria.

“A estrutura era realmente muito precária e a maioria dos profissionais que trabalhavam na instituição eram voluntários. Foi preciso investir em qualificação do pessoal, em especial das professoras. Em 2011, estabelecemos convênio com a rede municipal de ensino e começamos as mudanças necessárias”, conta.

Foram revistas a infraestrutura, a proposta pedagógica, e a instituição foi registrada no Conselho de Educação de Camaçari, entre outras ações que foram transformando a realidade das crianças atendidas.

Daí em diante, o caminho foi de ascensão. Em 2012 veio o ProInfância (Programa Nacional de Reestruturação e Aquisição de Equipamentos para a Rede Escolar Pública de Educação Infantil) e em 2013 o Paralapracá. “Com a chegada do Paralapracá, começamos a estudar mais, a termos encontros mais frequentes. A coisa começou a engatilhar”, conta. Nessa mesma época, relata a coordenadora pedagógica, foram contratados professores com nível superior.

“Esse ano (2014), a instituição está fortalecida e para o ano que vem (2015) a procura por vagas superou as expectativas”, comemora Edna Matos. Hoje, mais valorizadas na instituição, na comunidade e até nas famílias, as crianças pedem por mais exploração do mundo. “A escola fica no fundo de uma região conhecida como Pólo de Apoio e há muitas indústrias, então faz muito barulho. Elas agora querem saber que barulho é esse”, finaliza.

 O Paralapracá é um projeto do Instituto C&A, em parceria técnica com a Avante – Educação e Mobilização Social. O projeto se desenvolve em aliança com secretarias municipais de educação nos municípios, no ciclo II: Camaçari (BA), Maceió (AL), Maracanaú (CE), Natal (RN) e Olinda (PE) e no ciclo I: Caucaia (CE), Jaboatão dos Guararapes (PE), Feira de Santana (BA), Teresina (PI) e Campinha Grande (PB).

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