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Criança, sujeito do presente

Toda criança tem direito a um espaço no qual possa contar com educação e cuidados apropriados à sua faixa etária, e em que seja respeitada a sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. A afirmação, tomada como um princípio para o programa Paralapracá, aposta numa aprendizagem que parte do interesse da criança, que tem no brincar uma linguagem estruturante do seu desenvolvimento, garantindo que ela seja reconhecida como um sujeito de direito do presente e não apenas como uma possibilidade no futuro.


Desde 2010, o Programa já impactou a qualidade da Educação Infantil de 10 Redes Municipais de Educação Infantil no Nordeste, por meio da formação continuada de formadores, desse segmento. A iniciativa colaborou para que o brincar passasse a ocupar esse lugar estruturante, desencadeando um processo no qual as instituições começam a privilegiar a brincadeira como elemento essencial para a aprendizagem e o desenvolvimento das crianças, qualificando o atendimento nas instituições.


Impactos


Pesquisas acadêmicas ao redor do mundo têm revelado os impactos provocados pela proposta do Paralapracá.  Na Universidade do Norte da Flórida (EUA), por exemplo, uma professora publicou uma pesquisa sobre a aprendizagem baseada na exposição precoce a conteúdos acadêmicos. Após anos levantando dados, ela concluiu que esse tipo de prática além de não favorecer o desenvolvimento pleno da criança, não é preditor de sucesso acadêmico posterior.


A pesquisa, realizada nos EUA, tomou como amostragem 343 crianças de pré-escola de três instituições com orientações diferentes: uma com foco no conteúdo; outra que encorajava a aprendizagem “iniciada pela criança”; e uma terceira, entre essas duas orientações. Anos depois, ao final da quarta série, a pesquisadora observou que aqueles que receberam mais conteúdos, com base em demandas externas, ganharam notas significativamente mais baixas do que aquelas que tiveram mais oportunidades de aprender pela brincadeira.


A pesquisa foi divulgada no boletim Exchange Every Day, vinculado à revista norte americana Exchange – publicação que dissemina temas voltados para dar suporte aos profissionais que trabalham com a primeira infância. No texto, a professora afirma que “o progresso das crianças pode ter sido reduzido pelas experiências pré-escolares excessivamente focadas no conteúdo, introduzindo experiências de aprendizagem formal muito precocemente, considerando o status de desenvolvimento da maioria das crianças”.


Em outro artigo, publicado pelo o New York Times: Let the Kids Learn Through Play (Deixem as crianças aprenderem por meio da brincadeira), o escritor de ciência, David Kohn, afirma que a educação que expõe as crianças a conteúdos de forma precoce “irá falhar no sentido de produzir pessoas capazes de descobertas e inovações, e irá, meramente, produzir pessoas com maior probabilidade de se tornarem consumidores passivos de informação, mais seguidores do que inventores”. E pergunta: “Que tipo de cidadão nós queremos para o século 21?”


Transformação


Nos municípios parceiros do programa Paralapracá, a aprendizagem focada em conteúdos disciplinares é uma realidade que vem mudando, acredita Maria Thereza Marcilio, presidente da Avante – Educação e Mobilização Social e assessora técnica do Programa. “Apesar de ainda ser um desafio, já percebemos mudanças na garantia do direito ao brincar como meio para aprendizagem das crianças e isso é uma consequência desse trabalho”.


A presidente da Avante ressalta a importância da formação continuada de educadores para a garantia desse direito. “Com as formações, a gente quer que o brincar não seja esquecido, nem encarado como algo supérfluo. E isso tem se transformado nas instituições que integram o Paralapracá. Você já não vê mais só papel, lápis, letra e número usados em atividades de cópia ou tarefas mecânicas, é notável o aumento de práticas de leitura e de escrita que têm sentido para a criança, e um aumento das oportunidades de brincadeira livre, iniciadas pelas crianças, sem direcionamento dos adultos; além do uso de materiais naturais”, disse.


Em Maceió (AL), Rede Municipal parceria do Paralapracá, a coordenadora pedagógica do Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) Presidente Francisco de Paula Rodrigues Alves, Ana Cristina Rodrigues, destaca a importância do professor no processo. “Talvez a conquista mais importante seja o envolvimento e entendimento dos professores para a necessidade de criar possibilidades de brincar, levando a criança a se expressar e desabrochar suas potencialidades, além de explorar os espaços pelo movimento, experimentar variedades de materiais e suportes, ofertar oportunidades de brincadeiras espontâneas e também brincadeiras mediadas pelos educadores”, ressalta.


Alerta


A presidente da Avante ressalta o contexto social predominante de adultização da criança, e como isso se apresenta no contexto de aprendizagem por meio da exposição a conteúdos que, muitas vezes, fogem do campo de interesse da faixa etária das crianças que frequentam a Educação Infantil. “Não é colocar os meninos para realizar tarefas de cópia ou de treinos mecânicos com o alfabeto e os algarismos aos quatro anos de idade, por exemplo, que vai fazê-los mais competentes quando crescem. É no brincar que as crianças exploram, criam, constroem sentido. De um modo geral, historicamente o brincar tem entrado na Educação Infantil como algo que se faz quando não há nada para fazer, ou muito dirigida pelos adultos, para validar ou justificar aprender alguma coisa, via brincadeira”, disse.


O Programa


O programa Paralapracá é uma frente de formação de profissionais da Educação Infantil, realizado pela Avante – Educação e Mobilização Social (www.avante.org.br), com apoio do Instituto C&A. Nosso trabalho se desenvolve a partir da formação continuada de formadores, com o objetivo de contribuir para a melhoria da qualidade do atendimento às crianças na Educação Infantil, com vistas ao seu desenvolvimento integral. Fazemos isso em parceria com as Secretarias Municipais de Educação, valorizando, ampliando e fortalecendo os saberes de cada localidade aonde vamos.


O Paralapracá foi lançado em 2010, como um projeto do Programa Educação Infantil do Instituto C&A, originalmente focado na região Nordeste. Desde então, chegou a dez municípios, em dois ciclos de implementação. Em 2015, com a chancela do Guia de Tecnologias Educacionais do MEC, ganhou caráter nacional.

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