Vozes na Pandemia: O dia do trabalho e as saudades

Por: Marianna Canova, professora da escola Peixinho Dourado, Curitiba – SP
No dia 01 de maio de 2020, dia do trabalho, em meio a um isolamento social há mais de 40 dias, me vi pensando sobre essa data, sobre meu trabalho…

Eu que sempre gostei do “respiro” do feriado na rotina intensa de uma escola no mês de maio, parei para pensar na saudade…

Saudades do bom dia na entrada, do sorriso (ou choro) das crianças ao chegar na escola, do cheiro da comida da cozinha, das músicas cantadas pelas salas, das ideias mirabolantes das professoras (es), das conversas pedagógicas com a equipe às 7h30 da manhã de uma terça feira, dos cafés com pais às segundas no final da tarde para conversarmos sobre desfralde, birras ou sexualidade infantil, regado à torta de banana.

Saudades das viagens pedagógicas que nos estimulam a encontrar boas escolas pelo mundo, de descobrir técnicas diferenciadas para, principalmente, transformar a educação em uma maravilhosa ferramenta de desenvolvimento de pensamento proporcionando, assim, crianças mais criativas e preparadas para melhorar o mundo…

Saudades de ver bebês descobrindo, crianças questionando, mães perguntando, professores (as) vibrando… De gente aprendendo no dia a dia da escola!

Saudades de ter dúvidas sobre a escolha de cada professor (ra) para cada turma no novo ano, de ler cada avaliação, de atender cada família com dúvidas sobre o comportamento do seu filho, de ver desenhos e documentação pedagógica espalhadas pela escola… Saudades até de atender uma mãe cujo filho de 1 ano foi mordido…e se você é mãe sabe do que eu estou falando…rs

Saudades dos sorrisos das meninas da limpeza, de arrancar matinhos do jardim do berçário, de ter que decidir quais das dezenas de acontecimentos ocorridos no dia vai para as redes sociais da escola (e de mudar na última hora), de escolher materiais diferenciados para oferecer às crianças, de orientar uma professora sobre uma possibilidade diferenciada em um brincar heurístico, dos passeios ao museu do olho, das aulas especiais, planejamentos intensos e ideias impensáveis…

Saudades de ver as crianças correndo pelo pátio em meio à um território, ou na hora do parque descendo o escorregador no colo de uma professora. Saudades das pesquisas que uma turma de 4 anos faz as profissões, sobre quem é a pessoa mais alta ou mais baixa, ou sobre a nossa opinião a respeito à transformação das borboletas…

Saudades de horas e horas de conversas pedagógicas para escolher o melhor caminho e a melhor oportunidade de permitir uma criança aprender. Saudades dos “Escola com vida” e de ver a família dentro da escola brincando, tendo aula de capoeira, experimentando um creme de abacate e sentindo a textura do fubá escorrendo pelas mãos em uma proposta escolhida com muito carinho por uma professora…

Saudades de ver uma coleção de folhas em uma sala, de descobrir junto com as crianças uma determinada pesquisa mirabolante como qual o tamanho do rabo de uma cutia ou que joaninha tem casulo… de comprar materiais impensáveis numa loja de materiais de construção para as crianças aproveitarem.

Saudades das risadas da sala dos professores, das crianças felizes e ansiosas no dia do aniversário ou na visita do Papai Noel… de ver a alegria nos olhinhos das crianças ao descobrir no cardápio da entrada que vai ter macarrão na hora do almoço, saudades até de ter que ligar para uma mãe para avisar que o filho se machucou… (de leve, é claro)

Saudades de ajudar uma criança a amarrar o tênis ou limpar o nariz, de indicar um livro especial para uma família, de ajudar uma auxiliar no trabalho da faculdade.

Saudades de ver as crianças dando comida para os peixes, tirando uma soneca na hora do almoço, aprendendo a comer sozinhas ou saindo da sala dando a mão para um colega que no início do ano não aceitava chegar perto…

Saudades de conversar com uma professora sobre a melhor estratégia para ajudar a criança a segurar corretamente o lápis, experimentar um alimento diferenciado ou entrar na escola sem chorar… Saudades do choro no final da tarde daquela criança que não quer ir embora e do sorriso de conquista e troca de olhares com a professora por conta de uma adaptação finalizada.

Saudades de mostrar a escola para uma nova família com o auxílio de uma criança de 5 anos cheia de orgulho do meu trabalho, e de ver no olhar deles que uma escola de educação infantil é mais do que o cuidado… Saudades de ajudá-los a perceber que essa é a fase mais importante da vida de um ser humano e que, se soubermos utilizar bem esse tempo por meio de propostas inteligentes, desenvolvimento de autonomia e habilidades emocionais formaremos adultos mais sensíveis, mais resilientes e mais seguros para tomar decisões importantes na vida, permitindo que vivam a infância com o respeito que a infância merece .

No dia do trabalho o que senti foi saudades do meu trabalho!

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