A Educação Infantil, como hoje a conhecemos no Brasil, é relativamente nova na área da Educação. Foi somente com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 (LDB 9394/96) que o segmento foi definido como pasta da Educação Básica. Até então, o atendimento público a essa faixa etária se dava no âmbito da Assistência Social, voltado para as classes D e E, com foco em cuidados básicos, como um espaço para as famílias, especialmente as mães, deixarem seus filhos enquanto trabalhavam. Já as crianças e bebês das classes média e alta frequentavam berçários ou escolinhas do maternal e infantil com uma proposta um pouco mais ampliada, envolvendo brincadeiras, jogos e contato com livros e números.
A LDB disciplinou o campo, homogeneizou a nomenclatura e definiu como foco de atenção para essa faixa etária a educação e cuidados necessários, e o responsável pelas crianças e bebês passou a ser a professora. Desde então, várias normativas surgiram com esse olhar para a Educação Infantil, a exemplo das Diretrizes Nacionais Curriculares (DCNEI) e o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), que incluiu financiamento específico para o segmento. E a Base Nacional Curricular Comum que, prestes a ser aprovada, irá substituir a DCNEI, além de documentos de apoio, tais como os Parâmetros de Qualidade de Infraestrutura e os Indicadores de Qualidade da Educação Infantil (INDIQUE). Todos esses avanços exigem um enorme esforço dos governos, dos profissionais e das famílias para percorrer o longo caminho que ainda há pela frente para transformar a intenção, garantida nos documentos, em gesto.
Exemplo desse esforço pode ser visto em alguns municípios do Nordeste, cujas redes municipais são, ou foram, parceiras do Paralapracá nos últimos dez anos. A parceria colaborou para a concretização de algumas dessas conquista, em especial a visibilidade de uma agenda de atendimento educacional de crianças de 0 a 5 anos, a partir de avanços nas políticas locais de Educação Infantil, na compreensão do que significa um atendimento de qualidade, e no reconhecimento do papel do coordenador pedagógico como formador.
Partindo de ações formativas, o programa Paralapracá, direta ou indiretamente, tem mobilizado e formado uma cadeia de profissionais dos municípios, como: prefeitos, secretários de Educação, técnicos de Educação Infantil das secretarias, diretores, professores e demais funcionários das instituições que atendem a esse segmento da Educação, sendo os coordenadores pedagógicos e os técnicos responsáveis pela formação nas redes municipais o público central do Programa.
Segundo Daniel Brandão, coordenador-geral da Move Social, instituição responsável pela avaliação externa do Paralapracá, o Programa instalou um processo de formação continuada dos coordenadores pedagógicos, que passaram a exercer a função primordial de formadores de professores e parceiros destes na construção de boas práticas. O impacto nos centros de Educação Infantil, por sua vez, provocou o surgimento de outra agenda junto aos gestores e equipes técnicas locais, qual seja a necessidade de apoiar a formação e o desenvolvimento dos coordenadores pedagógicos, o que vem contribuindo para a sustentabilidade das conquistas alcançadas. “A partir do momento em que foi aberta essa agenda, esses profissionais souberam ocupar este lugar e, fortalecidos, foram ampliando a visibilidade da Educação Infantil”, disse Daniel Brandão.
De acordo com registros que integram o relatório de avaliação da MOVE Social, as equipes técnicas de Educação Infantil dos cinco municípios parceiros na segunda edição do Paralapracá – Olinda (PE), Maracanaú (CE), Camaçari (BA), Maceió (AL) e Natal (RN) – afirmam que o espaço conquistado e legitimado se encontrava, historicamente, sombreado por outras etapas educativas. A implementação do Paralapracá proporcionou um avanço nas práticas docentes orientadas para o desenvolvimento integral das crianças, possibilitando um maior equilíbrio no diálogo com o Ensino Fundamental I, por exemplo. “Avançou-se numa compreensão mais clara da função dessa etapa e do significado dos eixos do Programa para o desenvolvimento de práticas com as crianças, existindo situações, inclusive, em que professoras dos anos iniciais do Fundamental I adotaram práticas da Educação Infantil”, conforme relatório da MOVE Social, de 2016.
É também o que afirma Ana Dayse Dórea, secretária de educação de Maceió, em ofício enviado este ano (2017) à equipe do Paralapracá, celebrando a parceria com o Programa: “Maceió celebra a aliança mantida com Instituto C&A ao longo desses cinco anos e comemora os avanços alcançados na Rede a partir das formações dos coordenadores pedagógicos e técnicos, por intermédio do fortalecimento da gestão das políticas públicas municipais de Educação Infantil implementada em parceria técnica com a Avante – Educação e Mobilização Social”, disse a secretária.
No entanto, o relatório de avaliação externa aponta que há, ainda, um caminho desafiador a ser percorrido. “Por mais que existam resultados nessa dinâmica, o alinhamento ao redor de questões sensíveis, como a alfabetização, não foi alcançado”, registrou a MOVE Social no documento. Mônica Samia, consultora associada da Avante e coordenadora de implementação do Paralapracá, corrobora com a informação, também evidenciada nas ações de monitoramento do Programa, e contextualiza: “A questão da alfabetização na Educação Infantil tem sido debatida como se houvesse dois times: um que advoga pelo brincar e outro pelos processos de escolarização, o que é um grande equívoco”.
Mônica Samia afirmou que a visibilidade crescente da Educação Infantil e sua inserção como primeira etapa da Educação Básica, acompanhada de uma compreensão cada vez mais aprofundada sobre as potencialidades da criança pequena, não deixam dúvidas de que ela pode aprender muito nessa etapa. “A escola é, portanto, um espaço intencional para promover aprendizagens de diversas naturezas, incluindo as relativas à linguagem escrita. Mas, para que isso ocorra de forma potente, é preciso compreender a forma peculiar de a criança aprender, que é por meio das situações prazerosas, que fazem sentido para ela. É o que o Paralapracá defende e tem buscado disseminar nas redes parceiras, mesmo enfrentando dificuldades de entendimento”, explica.
O Programa
O Paralapracá é uma frente de formação de profissionais da Educação Infantil, realizado pela Avante – Educação e Mobilização Social, em parceria com as secretarias municipais de Educação e com o apoio do Instituto C&A. O Programa visa contribuir para a melhoria da qualidade do atendimento às crianças na Educação Infantil, com vistas ao seu desenvolvimento integral. Para isso, oferece formação continuada para formadores das Redes Municipais, valorizando os saberes de cada localidade e ampliando as referências teórico-práticas a partir das orientações nacionais para o segmento.
O Paralapracá foi lançado em 2010 como um projeto do programa Educação Infantil do Instituto C&A, originalmente focado na região Nordeste. Desde então, chegou a dez municípios, em dois ciclos de implementação. Em 2015, com a chancela do Guia de Tecnologias Educacionais do MEC, ganhou caráter nacional.