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Da escuta à participação das crianças: experiência da Avante é apresentada na UFBA

Uma praça ocupada por bares e bingos, com a ausência deliberada de crianças. A cena, tão habitual nos bairros populares de Salvador, é o exemplo de como a apropriação indevida do espaço público viola os direitos da infância. Foi o que encontrou a equipe da Avante – Educação e Mobilização Social, quando deu início ao projeto Infâncias em Rede, no bairro do Calabar. Realidade modificada, ao longo de três anos, com a participação ativa das crianças e da comunidade.


Para relatar esse processo de mudança, a consultora associada da Avante, Ana Oliva Marcilio, esteve no I Ciclo Vulnerabilidades e resistências étnica-culturais de povos, crianças em territórios diversos, um intercâmbio de pesquisas relacionadas com a diversidade cultural e descolonização do pensamento, realizado no Instituto de Humanidades, Artes e Ciências – IHAC/UFBA, no dia 28 de março. Com o tema “Infâncias em Rede, da escuta à participação!”, Ana contou sobre como a escuta das crianças foi importante para a realização das atividades no Calabar, e os impactos do projeto na comunidade.


As ações do Infâncias em Rede materializaram o que as crianças apontaram como formas de reduzir a violência no Calabar, na pesquisa Foco na Infância: violência, políticas de segurança públicas e repercussões sobre a infância no Calabar/Alto das Pombas, realizada pela Avante e a UFBA, durante dois anos, dentro do projeto Foco na Infância. Ao citarem beleza, estética, cores e flores, elas indicam como é  importante se pensar o espaço público a partir do olhar da criança.


Vulnerabilidades e resistências


Falando majoritariamente para estudantes do Bacharelado Interdisciplinar de Artes, Ana Oliva considera sempre importante reiterar os direitos das crianças. “Eu falei do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), a perspectiva da criança como sujeito de direitos. É importante que isso esteja na formação profissional. Existe um grande desrespeito aos direitos das crianças, inclusive nas escolas, e muitas dessas pessoas possivelmente vão trabalhar em escolas e com crianças, serão educadores infantis. Como a gente trabalhou com vídeo, música, pintura, desenho, eu levei a questão do ponto de vista da beleza das crianças, que têm um senso estético próprio. Quando você as escuta, elas falam sobre isso.”


Sobre os resultados alcançados, ela destaca a recuperação de duas praças do bairro (praças do JUC e do Bomba), com ocupação de uma delas pelas crianças. “A praça era, inicialmente, um espaço para criança, porque tinha uma amarelinha em alto relevo, no chão, além de balanços e uma escorregadeira que foram retirados pela própria comunidade, por entender que estavam atrapalhando. Quando as crianças iam brincar, diziam que não era lugar para elas. Começou a mudar quando a comunidade reconheceu aquele espaço como espaço de criança. Eles retiraram as cadeiras dos bares, garantiram que pelo menos durante o dia aquele espaço ficaria com as crianças. Enquanto a gente estava na praça, não havia venda de bebidas alcóolicas.”


Além da reutilização dos espaços públicos, outra ação importante foi a produção do vídeo Bata na Porta, campanha com uma abordagem prática para o enfrentamento da violência doméstica que atinge milhares de crianças e adolescentes no país. Esse foi um dos temas levantados durante o projeto, quando as crianças foram questionadas sobre a Lei Menino Bernardo (Lei 13.010/2014), que estabelece como direito da criança e do adolescente serem educados e cuidados sem o uso de castigos físicos ou de tratamento cruel ou degradante.


Participação infantil


Presente ao evento, a coordenadora de Formação em Educação Infantil, da Secretaria da Educação de Salvador [integrante da Rede Estadual Primeira Infância da Bahia – REPI BA], Patrícia Paim, diz que o encontro fez pensar em como a participação infantil foi importante para as mudanças ocorridas no Calabar. “As crianças foram protagonistas em uma comunidade com grandes questões. Na pesquisa [Foco na Infância], que teve como foco os impactos da violência nas crianças, elas foram partícipes, tecendo opiniões, sendo escutadas. Depois, com o Infâncias em Rede, elas ocuparam esse espaço. São formas de mostrar a potência das crianças e o quanto possibilitam transformações.”


O Infâncias em Rede nasceu com o objetivo de desenvolver e articular estratégias de participação infantil a partir da escuta e consulta da primeira infância – crianças até 6 anos. Além de criar condições para que elas possam expressar suas necessidades e desejos, de forma a possibilitar que suas falas colaborem com a implementação de ações que impactem na promoção, garantia e proteção de seus direitos.
Realizado nas cidades do Rio de Janeiro e Salvador, é um projeto da Fundação Bernard van Leer. Na capital baiana, foi executado pela Avante – Educação e Mobilização Social, no bairro do Calabar, entre 2012 e 2015, em parceria com a Fundação Xuxa Meneghel, Rede +Criança e a Rede Nacional Primeira Infância (RNPI).

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