ENTREVISTA: Tertúlias Dialógicas promovidas pelo Comunidade de Aprendizagem promovem aprendizado e fortalecimento de laços

Interpretação de texto, habilidades orais, respeito e aproximação da escola com as equipes das secretarias de educação. Esses são alguns dos focos de uma “Atuação Educativa de Êxito” que vem transformando as escolas atendidas pelo Comunidade de Aprendizagem e promovendo a sustentabilidade do projeto nas redes.

São as Tertúlias Dialógicas que, a partir da leitura e do diálogo vem unindo comunidade, instituição de ensino e fortalecendo laços com os gestores. A iniciativa vem atendendo à proposta do projeto Comunidade de Aprendizagem executado pela Avante – Educação e Mobilização Social em Fortaleza e Horizonte, no Ceará e em Camaçari, na Bahia. A iniciativa tem como foco a transformação social e cultural com início na escola, expandindo-se para toda a comunidade a partir da participação de familiares, funcionários, alunos e voluntários nas decisões e atividades da instituição.

Para ser uma comunidade de aprendizagem a escola implementa “Atuações Educativas de Êxito” e passa por um processo de transformação que envolve seus diferentes atores. O projeto prevê ainda a formação de técnicos das secretarias de Educação dos municípios atendidos para posterior acompanhamento e ampliação das ações na rede.

Para sabermos um pouco mais sobre as Tertúlias Dialógicas conversamos com a coordenadora do projeto, Carol Duarte, que nos explica como elas acontecem nas escolas e com as equipes das secretarias municipais de Educação.

ENTREVISTA

Avante – O que são é a Tertúlia Dialógica?

Carol Duarte – É uma Atuação Educativa de Êxito onde, no caso dos alunos, é lido um clássico da literatura brasileira e universal, focado para sua idade. E com os técnicos das secretarias, ou professores e coordenadores um texto pedagógico, de um educador renomado que possa agregar a proposta do projeto de melhorar aprendizagem e proporcionar ou fortalecer a parceria escola/comunidade.
Avante – Como elas acontecem?

Carol Duarte – A cada encontro o grupo lê um texto ou o pedaço de um livro e cada um marca o trecho que mais lhe chamou a atenção, seja por ter achado bonito, seja por ter alguma relação com sua história de vida ou, no caso dos técnicos, com sua área de trabalho. Ele lê o pedaço destacado, diz qual é a página, todos leem junto e então o aluno/técnico explica o porquê da escolha. Na escola isso é feito uma vez por semana. Com os técnicos são marcados encontros periódicos.

Avante – Qual o foco dessa ação?

Carol Duarte – Bem, junto aos alunos o foco é estimular o aprendizado da interpretação de texto, habilidades orais, respeito e, porque não conteúdos que vão para outras disciplinas como a aulas de português em si, ou mesmo curiosidades sobre um evento histórico, por exemplo, que levarão para pesquisar nas aulas de história.

Junto aos técnicos, além de promover uma reflexão sobre sua área de atuação, possibilita uma aproximação, a partir da experiência, da ação realizada na escola, em parceria com a comunidade. Isso vai dar uma condição melhor aos técnicos de colaborar com essa aprendizagem e fortalecer laços entre os atores envolvidos, além de dar sustentabilidade à proposta na rede municipal. Um dia a iniciativa da Avante e Instituto Natura naquela rede var chegar a um ponto de fechamento de ciclo, e para que a ação tenha continuidade, o único caminho é a autonomia da rede.

Avante – Fale mais um pouco sobre como se dá o aprendizado desses conteúdos nas escolas.

Carol Duarte – Quando os participantes da Tertúlia Dialógica selecionam um trecho do texto para discutir, eles estão relacionando esse texto com a sua vida e essa é uma competência muito pobre no Brasil hoje – a interpretação de texto. Então, quando se dedicam à discussão desses trechos, compartilhando pontos de vista e sentimentos, eles estão aprendendo a desenvolver habilidades orais, tão importantes até mesmo para ingressar no mercado de trabalho.

Já o respeito é trabalhado a partir do momento em que eles falam o que estão sentindo e o outro ouve, sem julgamento de certo, nem errado. O desrespeito não cabe no momento da Tertúlia e o papel do mediador é justamente garantir esse espaço respeitoso de fala e escuta. É possível haver discordâncias, mas é preciso colocar as razões para isso. E para se colocar tem que respeitar a ordem de inscrição garantida pelo mediador.

Avante – Quem são os mediadores?

Carol Duarte – Nas Tertúlias Literárias Dialógicas, nas escolas, qualquer um da comunidade que queira participar como voluntário, que se mostre interessado. A gente acredita que todo mundo tem alguma coisa para ensinar. Tem escolas lá em Horizonte (CE), por exemplo, em que as mediadoras são a auxiliar de serviços gerais e a merendeira. Elas se mostraram interessadas e afirmaram que queriam ler os clássicos e fazer a Tertúlia com os meninos.

Com os técnicos quem faz a mediação é o formador local do projeto, que é alguém integrado à equipe do projeto. O papel do formador local é orienta e formar as pessoas que vão atuar nas Atuações Educativas de Êxito. No caso das Tertúlias Dialógicas, o formador local explica como acontece, faz um piloto com os voluntários, e faz o acompanhamento mensal, fazendo ajustes, quando necessário, orientando, por exemplo, algum professor da grade regular que tenha dúvida em relação à ação.
Nesse caso, o professor é chamado para atuar como voluntário e, assim, sair da teoria e ir para a prática. De forma adaptada, é o que estamos fazendo com os técnicos.

Avante – A participação da equipe de serviços gerais da escola, como os auxiliares de serviços gerais e as merendeiras chega a ser uma surpresa se pensarmos nos desafios que são impostos a essa participação. Não que não gostem, ou não queiram, mas porque, no geral, não tiveram acesso à leitura (uma realidade brasileira). E agora estão lendo clássicos da literatura. Como isso tem funcionado?

Carol Duarte – Pois bem, isso mostra a amplitude da ação. Não importa se os voluntários não tenham tido acesso à leitura, agora eles têm a oportunidade de ler e, no caso de uma dupla, o fazem juntos e participam mediando. Não opinam na hora, só se quiserem, se sentirem-se à vontade, porque o papel do mediador é garantir o espaço de fala respeitosa e o espaço de escuta no momento que a Tertúlia acontece.

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