Os olhos arregalados e o sorriso nos rostos das crianças eram evidências incontestáveis de que a ação cumpria bem o seu objetivo. O alimento, sempre bem-vindo, dessa vez não era necessariamente para o corpo físico, mas uma poção mágica de alegria nas celebrações de aniversário das crianças atendidas pelo projeto Estação Subúrbio – Nos trilhos dos direitos (Avante e KNH). Mesmo em isolamento social, em função da pandemia causada pelo COVID-19, 19 crianças e adolescentes, que fizeram aniversário no primeiro semestre deste ano, puderam, em julho, enfim, cumprir o ritual de apagar as velinhas.
As celebrações aconteceram no seio familiar, sem abraços e beijos de amigos e amigas, já que estamos em tempos de isolamento social. Por isso, os kits de aniversário preparados pela Avante foram organizados para serem consumidos em casa – diferentemente dos anos anteriores. Desde o início do Projeto, em 2017, as celebrações dos aniversariantes do mês eram coletivas, na área externa da comunidade. No entanto, as atividades presenciais do Estação Subúrbio foram suspensas logo no início da pandemia, pela proteção à saúde dos meninos e meninas, assim como a celebração dos aniversários, esse momento tão marcante na nossa cultura, quando nos reunimos para lembrar um grande evento na vida das pessoas e uma boa razão para reunir família e amigos.
“Com a pandemia, as pessoas acabaram deixando em suspenso muitos laços afetivos. E a gente entende que a festa de aniversário é importante para sairmos da tristeza e entrarmos no campo da alegria”, disse a coordenadora do projeto e consultora associada da Avante, Ana Marcílio. Por isso, cada casa, de cada aniversariante, recebeu um bolo e kits de salgados e refrigerante. Na ocasião também foram entregues 27 kits de colorir (papel A4, tinta guache, pincel e lápis de cera) para as crianças, mesmo as que não estavam aniversariando.
O brincar com estratégia
O brincar coletivo – estratégia central utilizada pela Avante para a promoção de direitos de crianças e adolescentes – não tem data para ser retomado por conta do contexto atual. Segundo Ana Marcílio, as visitas semanais do educador brincante à Ocupação para promover as brincadeiras cedeu lugar às atividades realizadas dentro de casa, a partir de materiais e tutoriais para a produção de brinquedos e realização de brincadeiras. Kits de colorir, kits de pintura, massinha de modelar, meias para a produção de bolas e materiais para produção de piões foram alguns dos itens enviados pela Avante para as crianças.
“Inicialmente, usamos as tecnologias digitais, mas a eficácia não foi a mesma em razão de questões relacionadas à falta de conectividade e de acesso a aparelhos celulares – geralmente em poder dos responsáveis pelas crianças. Desde então, outros recursos estão sendo usados para promover as brincadeiras nos lares”, explica Ana Marcílio. Ela lembra que a essência do Projeto – a garantia dos direitos, tendo o brincar com principal estratégia -, é um corpo vivo, disponível e presente. “A brincadeira não é um espaço em que a gente se diverte. Até porque tem aquele que perde, chora e reage. Então, a gente aproveita o que a brincadeira traz para despertar emoções positivas para a vida. É preciso trabalhar com o que é positivo para dar conta da vida”, disse.
“A gente saía para brincar, ver os amigos pelo menos uma vez na semana. E agora a gente não pode mais brincar. O Projeto está fazendo falta”, disse Vitória, uma das crianças que participa do Estação Subúrbio, durante a entrega dos kits de aniversário. Ana Marcilio conta que as mães da comunidade têm relatado que, com as restrições impostas pela pandemia, em especial dos momentos para brincar, a agressividade entre as crianças aumentou. Sendo assim, desafio da Avante, agora, é manter o Projeto vivo nesse momento tão atípico, e buscar dar continuidade ao trabalho de redução da violência comunitária, em especial rem relação a crianças e adolescentes.