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O que a Escola pode aprender com as Paralimpíadas?  

As Paralimpíadas chegaram à sua 17ª edição. Mais de 4.400 competidores de 170 delegações estão na França, sede do evento multiesportivo direcionado a atletas com deficiência, para disputar medalhas em 22 modalidades.

O lema das Paralimpíadas – Espírito em Movimento (Spirit in Motion) – adotado nos Jogos Paralímpicos de Verão – 2004 – é uma ode à liberdade e um confronto à concepção funcionalista dos corpos, que aprisiona e reduz a pessoa com deficiência à sua divergência física ou intelectual. 

Os Jogos Paralímpicos, para além dos discursos midiáticos de superação e inspiração, afirmam e visibilizam as diversas potências da pessoa com deficiência. O evento contrasta com o capacitismo estrutural que formata diferentes esferas sociais, inclusive as instituições escolares, que, mesmo se propondo democráticas, não efetivam a inclusão dos estudantes com deficiência.

No Brasil, país que se configura como uma potência paralímpica, a Educação Física é um componente curricular obrigatório na Educação Básica. A disciplina engloba conhecimentos científicos, pedagógicos e técnicos sobre a atividade física e os esportes, no entanto, a maioria das crianças e adolescentes com deficiência permanece segregada.  

“O que acontece, muitas vezes, é que a criança com deficiência é privada do movimento pelo cuidado excessivo e isso impede que ela se desenvolva, porque quanto maior é o repertório motor, maiores são as possibilidades de ela criar habilidades. E essas habilidades – criadas na escola – de maneira socializada, possibilitam incluir realmente”, disse Antônio Bahia, Professor de Educação Física que possui longa experiência profissional em escolas e instituições sociais para pessoas com deficiência.

Embora a disciplina contribua com o desenvolvimento integral dos estudantes – físico, motor, socioemocional, comunicacional, cognitivo – além de melhorar a autoestima e prevenir doenças físicas e mentais – ela não integra todos os estudantes; realidade que, segundo o Professor Bahia, pode estar condicionada ao legado da ditadura no Brasil, que enviesou a prática esportiva escolar.

“Historicamente, a formação do professor de Educação Física foi militarizada e esportivizada. Somente depois da década de 80 é que houve uma mudança, e isso se refletiu na prática. Os alunos eram sempre selecionados pela sua habilidade e força, fazendo com que os estudantes com deficiência fossem excluídos”, explicou o professor.

O cotidiano escolar, no entanto, segue reproduzindo esses reflexos. Embora a formação de atletas não seja uma finalidade da escola, o esporte, para além da competição, é uma relevante estratégia para potencializar a socialização, a colaboração, o respeito às diferenças e a empatia; portanto, fundamental para as vivências escolares, como complementa o professor Bahia: “Na educação física, é preciso entender o propósito de jogar com e não contra o outro, quando você oferece possibilidade para que todas as crianças e todos os adolescentes se movimentem numa relação de sociomotricidade, você constrói essas habilidades e integra”. 

Para incentivar as escolas a elaborarem iniciativas de inclusão e despertar estudantes com deficiência para práticas esportivas profissionais ou olímpicas, o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) promove importantes ações com foco no contexto escolar, como: as Paralimpíadas Escolares e o Curso EaD Movimento Paralímpico – CPB – voltado para professores de Educação Física, com objetivo de capacitá-los a ensinar esportes para pessoas com deficiência. 

De acordo com o regimento da seletiva estadual do CPB, as Paralimpíadas Escolares 2024 “têm por finalidade estimular a participação dos estudantes com deficiência física, visual e intelectual em atividades esportivas de todas as escolas do território nacional (…)”. O campeonato é voltado para crianças e adolescentes com deficiência e idade entre 11 e 17 anos. 

As seletivas das Paralimpíadas Escolares já revelaram atletas de alto rendimento e muitos representantes brasileiros nos Jogos Paralímpicos. Entretanto, apesar da iniciativa estar voltada para as escolas, na Bahia, a maioria dos atletas que participam das seletivas são descobertos e apoiados por entidades sociais e não, necessariamente, por seus professores ou escolas.

Conforme o professor Antônio Bahia, que atuou por 28 anos no Instituto de Cegos da Bahia, “são as organizações de pessoas com deficiência que têm mantido o esporte paralímpico vivo”. Segundo ele, a maioria dos integrantes do Instituto ficavam à margem do processo em suas escolas, enquanto que, na entidade, eles participavam das equipes de natação, atletismo e outras atividades. “Nós participamos dos Jogos Paralímpicos todos os anos com a equipe de pessoas cegas. Chegamos a ser sete vezes campeões brasileiros e três vezes campeões mundiais. Hoje, a seleção que está disputando o futebol de cegos tem dois ex-alunos do Instituto, então quanto mais a educação física focar na atividade e não em quem faz a atividade – maior será a discriminação”, argumentou.

Outro ponto crítico mencionado pelo professor, resultado do capacitismo estrutural, é a ausência de atenção e investimento dos órgãos públicos para os esportes paralímpicos. Segundo ele, a Secretaria de Educação fazia uma divisão assimétrica de recursos entre as Olimpíadas Escolares e as Paralimpíadas. “Eu cheguei a ser técnico da base da Seleção Brasileira de Cegos, era a maior dificuldade conseguirmos apoio para passagem, uniformes ou outro incentivo aqui no estado, existe um tratamento diferenciado para nós”, desabafou o professor Bahia.

Embora a prática de esportes exija estrutura adequada e acessórios diversos – problema para muitas escolas, sobretudo públicas e periféricas, que possuem boa parte dos seus espaços precarizados – o comprometimento dos docentes e da gestão escolar com a inclusão dos alunos PCDs é um fator determinante, sobretudo, para conscientizar e mobilizar a comunidade a construir ações reivindicatórias por uma educação inclusiva e de qualidade.

“Nós temos carência de um olhar para a inclusão. Essa inclusão está chegando pelas pessoas com deficiência que estão se organizando socialmente, e essa organização tem trazido frutos”. A assertiva do professor confirma a crescente força política das pessoas com deficiência em torno dos seus direitos, assim como a negligência do Estado na implantação de políticas públicas efetivas de inclusão.As Paralimpíadas, a partir das adaptações realizadas para que os atletas disputem, tenham autonomia e acessibilidade aos espaços, demonstram que todas as barreiras são o mero resultado da deficiência do nosso olhar. Que os agitos, símbolos da bandeira paralímpica (palavra latina que significa “eu me movo””), impulsionem um movimento mundial em direção à inclusão, e que a largada seja dada pela Educação.

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