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Avante reflete sobre a leitura infantil

 
O livro faz toda diferença na formação dos pequenos cidadãos, que tem na leitura uma porta de acesso a um mundo de conteúdos, experiências, informações e desenvolvimento humano e intelectual. Por tudo isso, desde 2002, foi instituído o Dia Nacional do Livro Infantil – 18 de abril. A Avante –  Educação e Mobilização Social milita para que mais crianças tenham efetivo e garantido o seu direito de acesso ao livro e à leitura. Para refletir sobre a importância da data, a coordenadora da Linha de Formação de Agentes Culturais e articuladora da Rede EMredando Leituras, Rita Margarete, concede entrevista ao nosso site e tece um panorama sobre o livro e a infância.
Avante – Qual a importância da leitura na vida de uma criança?
Rita Margarete – Considerando leitura literária, ao falar da sua importância, é fundamental não cair na tentação de buscar funcionalidade. Compreendo que a leitura literária não tem uma função de uso prático e, nem sempre, é de compreensão imediata. Todavia, os textos literários falam das emoções e experiências humanas: medos, angústias, afetos, separações, situações familiares; revelam conflitos. Emoções, sentimentos e situações que estão presentes na vida das crianças e, neste contexto, a literatura, pode contribuir significativamente para aguçar nosso lado emotivo para reflexão do mundo que nos cerca: cultura, valores, conceitos e preconceitos.
A obra literária rompe com os padrões vigentes em termos de visão da realidade e instiga a reflexão de uma sociedade ou de uma época, ao expor suas contradições através de aspectos culturais, sociais e históricos. Dessa forma, a leitura literária pode contribuir para o leitor compreender melhor a si mesmo e ao mundo e para a formação da consciência crítica.
Avante – A leitura pode fazer parte da formação do caráter de uma criança?
Rita Margarete – Penso que a leitura literária, acima de tudo, instiga e alimenta sonhos. Possibilita ao leitor sair do mundo real, estimulando sua criatividade e imaginação. Nesta perspectiva, costuma-se dizer que a leitura literária humaniza as pessoas.
Segundo Antonio Candido, a literatura atende à nossa imensa necessidade de ficção e fantasia e possui natureza essencialmente formativa, pois atinge o consciente e o inconsciente dos leitores de maneira bastante complexa e dialética.
Avante – Existem políticas públicas de incentivo e estímulo à leitura na infância?
Rita Margarete – Em 2006 foi criado, por decreto do presidente Lula, o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL).  Neste plano foi estipulado que até 2010 todos os estados e municípios brasileiros deveriam criar os seus Planos Estaduais do Livro e Leitura (PELL) e Planos Municipais do Livro e Leitura (PMLL), respectivamente, e que a implementação destes planos acontecesse até o final de 2012. Atualmente, aproximadamente 10 municípios declaram possuir seu PMLL. Dentre eles uma capital, Porto Alegre.
Aqui na Bahia o estado elaborou o texto e está na fase da consulta pública. Na capital estamos dando os primeiros passos: na tarde do dia 16 de abril, o prefeito ACM Neto assinou a minuta para criação do grupo de trabalho, dentro do Encontro de Construção do Plano Municipal do Livro, da Leitura e da Biblioteca da Cidade de Salvador.
Por terminar
 
Avante – O acesso ao livro ainda é um desafio em determinadas camadas sociais?
Rita Margarete – Sim, embora existam muitas publicações e programas governamentais. Haja vista que o Brasil tem indústria de reconhecida qualidade gráfico-editorial, possui mais de 500 editoras e é responsável por mais da metade dos livros editados em nosso continente. As escolas públicas recebem livros do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), por exemplo. O que acontece é que mesmo a escola pública recebendo livro, em muitos dos casos as crianças tem acesso apenas ao livro didático e, quando muito, ao chamado paradidático. As práticas leitoras, principalmente de leitura literária, não estão presentes no universo das escolas, aliada a escassez de bibliotecas escolares.
Fora da escola, o livro, além de ter preço caro, ainda não faz parte do cotidiano de grande parte das famílias.
Avante – Como funciona a Rede EMredando Leituras?
Rita Margarete – A EMredando Leituras é uma rede de fomento à leitura criada em 2008 pela Avante e as bibliotecas comunitárias do Calabar, Sete de Abril e Paulo Freire e atualmente é composta por 8 organizações.
Entendemos que a leitura, assim como a escrita, são práticas essencialmente sociais e culturais e que para fomentar a formação de leitores, as atividades devem abranger quatro eixos: mediação, espaço, acervo e gestão.
Na mediação, os mediadores realizam regularmente atividades de fomento á leitura em diversos espaços: nas próprias bibliotecas, praças públicas, escolas, espaços culturais, creches, etc. Para mediar leitura é indispensável gostar de ler e ter alguma formação técnica (conhecimentos sobre mediação, espaço, acervo e gestão), então os mediadores de leitura participam de ações de formação técnica e de atividades de fomento à leitura para eles mesmos.
O espaço de leitura vai além de exposição do acervo. Deve permitir que os usuários/leitores (crianças, adolescentes, jovens, adultos), autonomamente, façam suas próprias buscas de leitura. A presença constante de um mediador no espaço de leitura é fundamental. Ele apresenta outras obras para o usuário visando ampliar seu repertório de leitura
a organização do acervo deve priorizar a diversidade de gêneros e de autores, especialmente literário. Deve estimular qualquer visitante a se aproximar, manusear, ler e levar emprestado,
A gestão do espaço de leitura, por sua vez, tem por responsabilidade garantir o bom funcionamento do espaço e atendimento de qualidade ao usuário. Para isso, as ações agrupadas nos eixos anteriores devem ser garantidas.
Avante – Hoje as crianças leem mais ou menos que há anos atrás?
Rita Margarete – É importante contextualizar essa pergunta e definir melhor: de quais crianças estamos falando? Se pensarmos que somente no final do século XX conseguimos universalizar o acesso ao ensino fundamental, temos uma quantidade muito grande de crianças que só muito recentemente entraram no mundo da escrita e da leitura. Dai poder-se-ia até dizer que temos mais leitores potenciais hoje do que antes. Por outro lado, a oferta de estímulos áudio visuais, seja via TV, seja via computador é um atrativo muito grande, porém essa é uma contingência da contemporaneidade com a qual temos não só de conviver como entender e fazê-la parte do processo educativo.
Por outro lado, a preocupação com a leitura é recente. Sobre a leitura literária é mais recente ainda. Atualmente a pesquisa usada como referência é a “Retratos da Leitura no Brasil”. Ela trata do comportamento leitor no país desde 2001. Os dados desta pesquisa mostram que os brasileiros estão lendo menos – caiu de 55% em 2007 para 50% em 2011. Este dado, somado aos resultados catastróficos do Brasil no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) revela uma situação bastante preocupante.
7. É necessário haver um maior estímulo à leitura entre as crianças?
Rita Margarete – A leitura é prática essencialmente social e cultural e não pode ficar sob a responsabilidade apenas da escola, mesmo sendo o espaço por excelência de aprendizagem, valorização e consolidação da leitura.  As crianças precisam ter contato com livros desde muito cedo, tanto na escola quanto em casa. É importante que visitas às livrarias e às bibliotecas façam parte do lazer das famílias. Da mesma forma, é primordial que pais e mães leiam para seus filhos.
Além de tudo isto é indispensável políticas públicas de fomento a leitura que contemplem espaços, acervo e ações de mediação. Falando de Salvador, por exemplo, com aproximadamente dois milhões e meio de habitantes, possui seis bibliotecas estaduais e duas municipais (nem todas em funcionamento) e cerca de 40 bibliotecas comunitárias. As livrarias por sua vez, cada vez mais, saem das ruas e concentram-se nos grandes shoppings, tornando-se menos visíveis ao cotidiano das pessoas.

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